O Centro de Umbanda Iemanjá, situado num afastado bairro do centro da cidade de Governador Mangabeira (distante 136 km de Salvador) viveu ontem, um dia histórico para o povo de santo com a celebração do primeiro casamento religioso e reconhecimento civil, no Recôncavo baiano, dos jovens Luis Carlos dos Santos (25) e Gisele Lopes Conceição (20). A sacerdotisa Eunice Brasil Santos (51), conhecida como Mãe Nice, fundadora e zeladora do templo, foi a celebrante da cerimônia prestigiada por cerca de 60 pessoas, a maioria filhos e filhas de santo da casa, todos descalços, trajados com vestes brancas usadas comumente nos rituais religiosos.
Visivelmente emocionada, a sacerdotisa, ao encerrar as bênçãos dadas aos noivos, disse que a realização do primeiro casamento num centro umbandista com validade civil, no Recôncavo, representava uma grande vitória para os adeptos das religiões de matrizes africanas. “Foi uma grande luta que travamos para chegar até aqui, pois ainda há muito preconceito e discriminação contra o povo de santo. É uma grande vitória, eu não posso deixar de reconhecer”, declarou Mãe Nice que fundou o Centro de Umbanda Iemanjá há oito anos. Para os recém-casados, a religiosa desejou “alegria, força, paz e equilíbrio para enfrentar os desafios da vida a dois”.
No salão onde a cerimônia foi realizada, imagens de santos católicos convivem harmonicamente com imagens de entidades cultuadas pelos umbandistas. Na entrada da cãs, o piso foi recoberto com folhas verdes. “São para dar energia e reforçar o axé”, explicaram os responsáveis pela decoração do ambiente. Nas paredes do templo chamam a atenção, as inscrições com os nomes de caboclos e guias. Para a celebração do casamento, o templo foi caprichosamente decorado com arranjos de flores e velas. Os noivos caminharam por uma passarela feita com pétalas de flores multicoloridas. Em vez de água benta, usada nos casamentos católicos, Mãe Nice aspergiu sob os noivos, gotas do perfume seiva de alfazema. Felizes eles se declaravam realizados. “Este era nosso sonho, casar aqui em nossa casa”, disseram Luis Carlos e Gisele, ambos lavradores.
O ato religioso começou pontualmente às 10h como estava previsto e durou aproximadamente 40 minutos. Queima de fogos na frente do templo antecedeu o ritual, iniciado com cânticos de saudação aos guias, santos e orixás. Colocados estrategicamente atrás da mesa da cerimônia, os ogãs alabês(tocadores de atabaques), entoavam os cânticos que eram acompanhados pelos presentes. A primeira a entrar no templo foi a sacerdotisa. Em seguida, um grupo de crianças, sendo que uma menina trazia consigo um estojo com as alianças. Ao som de um cântico em homenagem ao orixá Ogun, que no sincretismo religioso corresponde a Santo Antônio, entrou o noivo Luis Carlos dos Santos, filho de santo de Mãe Nice há cinco anos. Logo após entrou a noiva, com uma bata e saia roda branca ornamentadas com detalhes dourados, na cabeça trazia torço, também dourado, simbolizando a cor preferida de sua orixá, Oxum.
Entre os presentes, estava o babalorixá Benício Souza(60), do Terreiro Ogun Meje e presidente da Sociedade Filhos de Santo Antônio da cidade de Cachoeira. O sacerdote fez questão de estar presente para testemunhar, o ato que ele, classificou como “ímpar e de grande relevância para os seguidores das religiões de matrizes africanas”. O babalorixá lembrou que a cerimônia que estava acontecendo no Centro de Umbanda Iemanjá, era fruto de uma luta iniciada há cerca de cinco anos, por ele, pela ONG a Cidadã de Cachoeira e por babalorixás e yalorixás de diversos municípios da região. “Numa região marcada fortemente pela presença de terreiros de candomblé e casas de umbanda como o Recôncavo, não poderíamos deixar de lutar para assegurar que nossos filhos e filhas de santo tivessem o direito de casar de acordo com os nossos rituais, e em nossos templos, com o reconhecimento de uma união civil, como ocorre com outras religiões há mais tempo”, ressaltou o babalorixá.
O coordenador da ONG a Cidadã, Pedro Erivaldo Francisco(57), declarou que o casamento realizado no Centro de Umbanda Iemanjá, representa um marco relevante nas lutas contra a discriminação e a intolerância religiosa. “Quem é de candomblé ou de Umbanda tem o direito de casar em seus respectivos templos”, ele enfatizou, lembrando que todo o processo de mobilização para garantir esse direito aos seguidores das religiões de matrizes africanas, contou com a colaboração do então juiz da comarca de Cachoeira e atual coordenador das varas de família do Tribunal de Justiça da Bahia, Alberto Raimundo Gomes dos Santos. “Foi o magistrado que levantou essa discussão por meio de uma tese de sua autoria, além de sua colaboração pessoal para a elaboração e adaptação dos estatutos das entidades religiosas que asseguram a validade civil das cerimônias de casamento nos templos”, completou Pedro Erivaldo.
Trâmites - Para que os terreiros e centros de umbanda estejam habilitados para realizarem casamentos religiosos com validade civil é necessário que as casas sejam registradas como pessoa jurídica pela Justiça Federal, declarando-se como uma sociedade religiosa, ou seja, é necessário que tenha um CNPJ (Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica). Esse registro é obtido mediante a apresentação do estatuto, ata de constituição, que informe quem é o líder religioso. Na ata deve constar quem é o chefe da casa, suas atribuições, seus poderes, a competência de realizar casamentos, além de uma síntese com o histórico da casa. A ata precisa ser enviada ao cartório. Após o casamento no terreiro, é lavrado um termo próprio, tira-se uma certidão daquele registro no livro que deve ser encaminhada ao Cartório. Cabe então ao Oficial de Justiça concluir o processo e verificar se as formalidades legais foram realizadas. A partir daí, é lavrado o termo do casamento no efeito civil e emitida a certidão de casamento aos noivos. Os trâmites são os mesmos para as demais religiões.
Visivelmente emocionada, a sacerdotisa, ao encerrar as bênçãos dadas aos noivos, disse que a realização do primeiro casamento num centro umbandista com validade civil, no Recôncavo, representava uma grande vitória para os adeptos das religiões de matrizes africanas. “Foi uma grande luta que travamos para chegar até aqui, pois ainda há muito preconceito e discriminação contra o povo de santo. É uma grande vitória, eu não posso deixar de reconhecer”, declarou Mãe Nice que fundou o Centro de Umbanda Iemanjá há oito anos. Para os recém-casados, a religiosa desejou “alegria, força, paz e equilíbrio para enfrentar os desafios da vida a dois”.
No salão onde a cerimônia foi realizada, imagens de santos católicos convivem harmonicamente com imagens de entidades cultuadas pelos umbandistas. Na entrada da cãs, o piso foi recoberto com folhas verdes. “São para dar energia e reforçar o axé”, explicaram os responsáveis pela decoração do ambiente. Nas paredes do templo chamam a atenção, as inscrições com os nomes de caboclos e guias. Para a celebração do casamento, o templo foi caprichosamente decorado com arranjos de flores e velas. Os noivos caminharam por uma passarela feita com pétalas de flores multicoloridas. Em vez de água benta, usada nos casamentos católicos, Mãe Nice aspergiu sob os noivos, gotas do perfume seiva de alfazema. Felizes eles se declaravam realizados. “Este era nosso sonho, casar aqui em nossa casa”, disseram Luis Carlos e Gisele, ambos lavradores.
O ato religioso começou pontualmente às 10h como estava previsto e durou aproximadamente 40 minutos. Queima de fogos na frente do templo antecedeu o ritual, iniciado com cânticos de saudação aos guias, santos e orixás. Colocados estrategicamente atrás da mesa da cerimônia, os ogãs alabês(tocadores de atabaques), entoavam os cânticos que eram acompanhados pelos presentes. A primeira a entrar no templo foi a sacerdotisa. Em seguida, um grupo de crianças, sendo que uma menina trazia consigo um estojo com as alianças. Ao som de um cântico em homenagem ao orixá Ogun, que no sincretismo religioso corresponde a Santo Antônio, entrou o noivo Luis Carlos dos Santos, filho de santo de Mãe Nice há cinco anos. Logo após entrou a noiva, com uma bata e saia roda branca ornamentadas com detalhes dourados, na cabeça trazia torço, também dourado, simbolizando a cor preferida de sua orixá, Oxum.
Entre os presentes, estava o babalorixá Benício Souza(60), do Terreiro Ogun Meje e presidente da Sociedade Filhos de Santo Antônio da cidade de Cachoeira. O sacerdote fez questão de estar presente para testemunhar, o ato que ele, classificou como “ímpar e de grande relevância para os seguidores das religiões de matrizes africanas”. O babalorixá lembrou que a cerimônia que estava acontecendo no Centro de Umbanda Iemanjá, era fruto de uma luta iniciada há cerca de cinco anos, por ele, pela ONG a Cidadã de Cachoeira e por babalorixás e yalorixás de diversos municípios da região. “Numa região marcada fortemente pela presença de terreiros de candomblé e casas de umbanda como o Recôncavo, não poderíamos deixar de lutar para assegurar que nossos filhos e filhas de santo tivessem o direito de casar de acordo com os nossos rituais, e em nossos templos, com o reconhecimento de uma união civil, como ocorre com outras religiões há mais tempo”, ressaltou o babalorixá.
O coordenador da ONG a Cidadã, Pedro Erivaldo Francisco(57), declarou que o casamento realizado no Centro de Umbanda Iemanjá, representa um marco relevante nas lutas contra a discriminação e a intolerância religiosa. “Quem é de candomblé ou de Umbanda tem o direito de casar em seus respectivos templos”, ele enfatizou, lembrando que todo o processo de mobilização para garantir esse direito aos seguidores das religiões de matrizes africanas, contou com a colaboração do então juiz da comarca de Cachoeira e atual coordenador das varas de família do Tribunal de Justiça da Bahia, Alberto Raimundo Gomes dos Santos. “Foi o magistrado que levantou essa discussão por meio de uma tese de sua autoria, além de sua colaboração pessoal para a elaboração e adaptação dos estatutos das entidades religiosas que asseguram a validade civil das cerimônias de casamento nos templos”, completou Pedro Erivaldo.
Trâmites - Para que os terreiros e centros de umbanda estejam habilitados para realizarem casamentos religiosos com validade civil é necessário que as casas sejam registradas como pessoa jurídica pela Justiça Federal, declarando-se como uma sociedade religiosa, ou seja, é necessário que tenha um CNPJ (Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica). Esse registro é obtido mediante a apresentação do estatuto, ata de constituição, que informe quem é o líder religioso. Na ata deve constar quem é o chefe da casa, suas atribuições, seus poderes, a competência de realizar casamentos, além de uma síntese com o histórico da casa. A ata precisa ser enviada ao cartório. Após o casamento no terreiro, é lavrado um termo próprio, tira-se uma certidão daquele registro no livro que deve ser encaminhada ao Cartório. Cabe então ao Oficial de Justiça concluir o processo e verificar se as formalidades legais foram realizadas. A partir daí, é lavrado o termo do casamento no efeito civil e emitida a certidão de casamento aos noivos. Os trâmites são os mesmos para as demais religiões.