O presidente da Comissão de Anistia, Paulo Abrão, disse ter ficado decepcionado com a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de amparar sob a Lei de Anistia os torturadores que atuaram a serviço da ditadura militar. Para Abrão, a anistia foi editada para beneficiar as vítimas do regime, não os agentes da repressão que cometeram crimes contra a humanidade. Apesar disso, ele afirmou que a decisão terá de ser acatada por todos. "Embora discorde, temos que respeitar."
Contrariado, ele considerou decisão de certo modo esperada em razão das manifestações de vários ministros. Mas achou espantoso o voto do relator da ação, ministro Eros Grau, que a seu ver legitima a impunidade no País. "Pelo que ele afirmou, a negação da proteção às vítimas da ditadura e a impunidade dos torturadores constituem a norma fundante da democracia brasileira", criticou. "É o mesmo que dizer que a democracia se funda sob as bases da injustiça e da impunidade."
Porém, Abrão acredita que a decisão do STF não terá reflexos negativos sobre a Comissão da Verdade, criada pelo governo para apurar os crimes cometidos durante o regime militar e levantar dados que possam levar à localização e identificação de corpos de desaparecidos políticos.
A seu ver, alguns militares que temiam processo agora talvez se sintam estimulados a colaborar com a comissão, uma vez que não serão alcançados pela Justiça. "Mas nem com isso dá para contar, porque os militares brasileiros vivem em permanente estado de negação, mesmo os que não tiveram envolvimento com as condutas arbitrárias do passado", lamentou.
Para o dirigente, a decisão do Supremo contraria as convenções de direitos humanos e tratados internacionais firmados pelo Brasil sob a chancela da Organização das Nações Unidas (ONU). Ele lembrou que os demais países da América Latina que sofreram com ditaduras, como Argentina, Uruguai e Paraguai, estão enfrentando seu passado com mais firmeza e senso de justiça. "Estamos na contramão do mundo em matéria de direitos humanos."