Familiares, filhos de santo e populares participaram no final da tarde de ontem(sábado 26) em Cachoeira(distante 110km de Salvador) do traslado dos restos mortais da ialorixá Galdina Silva, Mãe Baratinha,a sacerdotisa era conhecida, do Cemitério da Piedade, onde fora sepultada em 18 de abril de 2004, para o Cemitério dos Africanos, no Alto do Rosarinho. A cerimônia marcada por momentos de fortes emoções também teve um importante significado histórico para Povo de Santo e afrodescendentes da cidade de Cachoeira, pois havia décadas que não se realizava nenhum sepultamento no cemitério construído por negros de origem africana, influentes que ganharam notoriedade na sociedade local no século XIX.
O Cemitério dos Africanos ou Cemitério dos Nagôs como também é conhecido é, segundo historiadores, o único no Brasil construído exclusivamente para sepultar negros africanos e brasileiros. Foi erguido em um terreno anexo à Igreja de Nossa Senhora do Rosário do Sagrado Coração do Monte Formoso (Rosarinho), construída por uma irmandade religiosa fundada por negros, situado ao lado do Cemitério da Irmandade da Ordem Terceira do Carmo, onde até meados do século xx eram sepultados os brancos e abastados da sociedade cachoeirana.
Os restos mortais da ialorixá Mãe Baratinha, iniciada no candomblé aos seis anos de idade agora repousa ao lado de ancestrais africanos, e também de importantes sacerdotes da culto afro como os lendários babalorixás Salacó e Zé de Brechó que contribuíram para reforçar o prestígio do candomblé de Cachoeira. Após a cerimônia deste sábado, o Cemitério dos Africanos, será transformado em memorial e os sepultamentos estão proibidos para sempre. Há um ano, foi totalmente restaurado pelo Programa Monumenta do Ministério da Cultura que também restaurou a Igreja do Rosarinho.
O ritual do traslado dos restos mortais de Mãe Baratinha para o Cemitério dos Africanos, começou pela manhã no Cemitério da Piedade, apenas com as presenças de sua filha consangüínea e sucessora na hierarquia religiosa a ialaxé Preta de Oxaguiã, ogãs do Terreiro Ilê Kaió Axé Alaketu Oxum, e filhas de santo dos orixás Iansã, Obaulaê e Ogun. Por volta das 16 horas, A ialaxé Preta de Oxaguiã retornou ao cemitério da Piedade junto com dezenas de filhos de santo, todos trajados de branco, alguns incorporados, para realizar o cortejo até o Alto do Rosarinho onde está localizado o Cemitério dos Africanos. Envoltos em um pano branco, os restos mortais da ialorixá foram levados pelos filhos de santo que se revezavam durante o trajeto. Na entrada do cemitério, essa tarefa coube a ialaxé Preta de Oxaguiã. Durante todo o percurso os participantes entoaram cânticos em iorubá.
Depois que os restos mortais foram depositados no jazigo, os presentes entoaram mais cânticos para saudar Oxum, o orixá de Mãe Baratinha, e o caboclos. Nesse momento, o ambiente foi tomado de fortes emoções, quando vários filhos de santo forma incorporados pelos orixás. “Esse é um momento muito importante para nós, porque significa que Mãe Baratinha saiu da vida individual e passou para vida coletiva”, disse o doutorando em Educação Brasileira, da Universidade Federal do Ceará e ogã do terreiro fundado por Mãe Baratinha, Emanoel Luis Roque Soares. “Estamos celebrando o início de um novo ciclo na história da existência de Mãe Baratinha”, complementou. Para o ogã Evandro Pio, a cerimônia o Cemitério dos Africanos, confirmou a importância que a sacerdotisa representava para a religião. “Mãe Baratinha foi um das mais importantes e influentes ialorixás da nação ketu para o Povo de Santo do Recôncavo”, destacou.
A ialorixá Jandira Cerqueira de Amorim, Mãe Bem, filha consangüínea do falecido babalorixá Manoel Cerqueira de Amorim, o Nezinho do Porão, responsável pela feitura do santo de Mãe Baratinha, acompanhou a cerimônia e contou que estava emocionada em saber que os restos mortais da sacerdotisa estão no Cemitério dos Africanos. “Ela agora está em sua casa definitiva ao lado de seus ancestrais”. Encerrado o ritual no Cemitério dos Africanos, todos os presentes se dirigiram para o Terreiro Ilê Kaió Axé Alaketu Oxum, onde foram servidas doces,salgados e bebidas.”A morte é uma festa por o povo de tradição iorubana, a energia não se esgota nunca”, resumiu o ogã Emanoel Luis.